terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Memórias


Sempre vi o Amor de uma forma muito minha. Apesar de romântica não me cativam coisas que geralmente são vistas como muito bonitas: como um belo bouquet de flores ou um presente em geral. O objecto tem de ter muito sentimento e um significado único, o que geralmente não se consegue comprando numa loja. Os gestos, esses, pesam uma tonelada. 

Lembro-me que um dia um amigo, que tinha um sentimento especial por mim e queria torná-lo mútuo, ligou-me porque queria oferecer-me um CD cujas músicas foram seleccionadas por si. Queria dar-mo naquele dia, um Sábado, e para isso ofereceu-se para passar em minha casa. Naquele tempo, nos nossos 17-18 anos, ainda não tínhamos carro e ele teria de fazer uma distância enorme de bicicleta. Sábado, era dia de me transformar em fada-do-lar e portanto as visitas não eram recomendadas. E foi o que lhe respondi. 

- Mas não demora nada.
- Não!

Contra a minha vontade ele resolveu aparecer mesmo assim e chegado a minha casa anunciou-se:

- Sou eu, vem ao portão por favor. Só quero entregar-te o CD.
- Não.
- Não acredito que não vens mesmo........
- Eu avisei-te que não iria.
- Sabes quanto tempo pedalei para chegar cá? Não sejas má.
- Não fui, eu disse exactamente o que faria.
- Mas... Tu és impossível. 

Ele atirou o CD para lá do portão, e o objecto por lá ficou, na relva, até eu o ir buscar horas depois. Podia ter ido ao portão? Podia, mas disse que não e não queria que no futuro interpretasse os meus "não" como "talvez".

O CD personalizado era muito giro, mas o que me tocou bem fundo não foi isso. Foi o tempo que perdeu para chegar cá, mesmo sabendo que corria o risco de não me ver, e o sorriso com que me recebeu quando nos vimos depois disso. Sem birras, só alegria. Era uma pessoa tão leve... Essa amizade fazia-me bem.

Revi esse amigo, que proporcionou algumas das situações mais originais e caricatas da minha vida, há uns dias atrás. E sorrimos com cumplicidade ao lembrar todas as coisas absolutamente tolas que ele fez naquele tempo e ao perceber que continuavamos os mesmos, ainda que mais maduros. 

O tempo deveria potenciar o melhor das pessoas, sempre, em vez de as tornar demasiado cuidadosas, quase medrosas. Não devíamos ceder a crescer completamente. Uma boa dose de inocência faz tão bem à alma...


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